Tropa de choque age e intimida o Senado

8 de agosto de 2009



A cena do presidente do Congresso, senador José Sarney, deixando o plenário ladeado por Fernando Collor e Renan Calheiros - seus dois mais novos e fiéis aliados - é símbolo mais evidente do atual processo de volta ao passado. Sarney, um político de biografia controversa, transferiu a faixa presidencial a Fernando Collor de Mello, em 1990, depois de humilhado por ele na campanha presidencial. Collor se referia a ele como ladrão e corrupto. Essas eram as ofensas menores.

Quando Collor se cansou de Simon e de Sarney, sobrou para o colunista que vos fala. O que disse é mentira. Mais uma vez: MENTIRA. E uma terceira: MEN-TI-RA.

Em 1992, a inversão: Sarney participou ativamente do processo de impeachment de Collor, afastado da presidência exatamente por corrupção. O terceiro personagem, o senador Renan Calheiros, é aquele ex-ministro de Collor, que depois abandonou o governo denunciando ex-chefe por...corrupção. Em 2007, foi a vez de Renan renunciar à presidência do Senado, acusado, entre outras coisas, de... corrupção.

O fato dos três terem acertado em cheio no julgamento que faziam uns dos outros no passado se soma agora ao fato de estarem juntos do mesmo lado. Nada mais natural. O que não é natural eles estarem no comando da vida parlamentar brasileira. Os três são peças essenciais para entender o atual processo de mortificação do Congresso.

Há seis meses, José Sarney tenta se defender de denúncias que o envolvem em nepotismo, favorecimento de amigos e parentes, contas secretas no exterior, desvio de recursos públicos e irregularidades administrativas. Pressionado a deixar o cargo, ele decidiu se afastar do comando do Senado, e chegou a comunicar isso ao presidente Lula, ao se sentir abandonado pelo governo e o PT. Foi quando entrou em cena a tal "tropa de choque", com seus métodos heterodoxos de fazer política à base da ameaça e da chantagem. Liderada por Collor e Renan, que, depois das acusações mútuas, acabaram se reconciliando, Sarney reconsiderou depois de ouvir da dupla que o PT, partido do presidente Lula, iria lhe garantir a permanência no cargo. De onde vinha a certeza? "O governo sabe que a CPI da Petrobras pode seguir o mesmo caminho da CPI dos Correios. Em véspera de eleição, ninguém vai quer isso", ponderou Renan.

A CPI da Petrobras foi criada pela oposição para investigar supostas irregularidades na estatal. O PMDB, partido de Renan e Sarney, controla a comissão. Ou seja: o PMDB, para garantir sustentação política a Sarney, chantageou o governo. Lula continuou trabalhando pela permanência de Sarney e o PT se recusou a assinar uma carta em que vários partidos pediram seu afastamento.

O jogo bruto para garantir a permanência de Sarney no cargo começou no domingo à noite, quando Sarney desembarcou em Brasília, vindo de São Paulo, onde acompanhava um tratamento de saúde de sua mulher, Marly. Ao chegar à Base Aérea, foi recepcionado por Renan, pelo senador Gim Argello (PTB-DF), e pelo ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, responsável hierárquico pela Petrobras. Foram para a casa de Sarney traçar a estratégia de resistência, definida em cinco pontos:

- Ameaçar o governo com a CPI da Petrobras;
- Acuar a oposição e os governistas que insistirem no "Fora Sarney" com denúncias de irregularidades;
- Escalar uma tropa para atacar os responsáveis por qualquer discurso anti-Sarney;
- Arquivar todas as representações contra Sarney no Conselho de Ética do Senado;
- Abrir um processo contra Arthur Virgílio, líder do PSDB, como forma de constranger os opositores.

A estratégia da tropa foi seguida à risca. Em discurso no plenário, o senador Pedro Simon, do PMDB, pediu o afastamento de Sarney. Foi interpelado por Renan Calheiros com insinuações maldosas e atacado com grosseria por Fernando Collor. "São palavras que não aceito! Quero que o senhor as engula e as digira como achar conveniente", bradou Collor "Estou no Senado há mais de 30 anos, desde a ditadura. Nunca vi nada semelhante", disse depois Simon. A truculência sempre fez parte do DNA da dupla Collor-Renan.

Dando sequência ao plano elaborado, o PMDB representou no Conselho de Ética contra o senador Arthur Virgílio, que mantinha em seu gabinete um funcionário que morava no exterior. A medida provocou um deprimente espetáculo. "Senador Renan, não aponte esse dedo sujo para mim", disse o senador Tasso Jereissati, do PSDB. "Seu coronel de merda" esbravejou o maquinista do trem que conduz o Senado brasileiro de volta à lei do cangaço.

Revista Veja

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